Escrever é processo doloroso
Como fatiar de si mesmo pedaços
Fragmentos unidos de maneira tal
Que os anime a ponto de quase respirarem
Resquícios feridos que encontram em olhos atraídos
O motivo do meio lúgubre -
Retalhado, mesmo, é o coração -
Unem-se sangrando
Dando formato a traços no branco dum papel
Lidos pelo senhor sentado no banco tirando seu chapéu
Sentidos pelos empáticos olhos pintados agora borrados de lágrimas
Mas a dor é necessária
Se não houver ali alma
Então escreves por nada
Escrever, descrever
Doloroso prazer solitário
Palavras que surgem como dores de parto
E nascem sem qualquer alarde
Diálogos vogais
Monólogos consonantais
Palavras que aguardam ser frases
Eternizam quem acreditam ter fim
Mas que, na verdade, pode alcançar longevidade
Não somos nós quem as escolhemos
São elas que nos escolhem
No seu momento, a seu tempo
Retirando com seus afiados gumes
Lâminas de sentimento
Não deve haver contra elas quaisquer argumentos
Somente e tão somente seus tipográficos
Substencial e cuidadosamente dispostos
Ganhando vida nas quilométricas linhas .